ESCLERODERMIA: O QUE É E AS SUAS CONSEQUÊNCIAS
Esclerodermia é uma doença do tecido conjuntivo que afeta a pele, e algumas vezes os órgãos internos. Apresenta uma variação muito grande em termos de prognóstico. Para alguns pacientes representa apenas um incômodo, enquanto para outros é uma doença grave e letal, sendo para a maioria uma doença que afeta o modo como elas vivem o seu dia a dia. A esclerodermia é classificada como uma doença autoimune devido ao fato de que o sistema imunológico ativado agride os tecidos do próprio organismo.
Existem dois tipos de esclerodermia: a forma sistêmica (esclerose sistêmica) que afeta os órgãos e sistemas internos do organismo, e a forma localizada, que afeta uma área localizada da pele poupando órgãos internos. Como regra geral, as crianças apresentam tendência a apresentar a forma localizada (subdividida em esclerodermia linear e morféia), enquanto os adultos geralmente manifestam a forma sistêmica, o fenômeno raynand pode aparecer nas mãos, pés e pontos como nariz e orelhas, com aceleração trifásica da cor esbranquiçada seguida de roxo e vermelho.
Na esclerose sistêmica, o sistema imunológico costuma causar dano a duas áreas principais: os vasos sanguíneos de pequeno calibre e as células produtoras de colágeno localizadas na pele e em todo o organismo. Na esclerose sistêmica, os vasos sanguíneos de pequeno calibre nos dedos das mãos tendem a estreitar-se e por vezes o fluxo sanguíneo é completamente ocluído. Pequenos cortes nas mãos podem apresentar uma cicatrização muito lenta, e por vezes evoluem espontaneamente para ulcerações. Devido a esta diminuição no suprimento sanguíneo, os pacientes esclerodérmicos são notoriamente sensíveis ao frio. É este componente vascular da doença o responsável pelo fenômeno de Raynaud (alterações da coloração dos dedos que ficam roxos seguidos de branco e vermelho quando expostos ao frio), que ocorre em mais de 90% dos pacientes com esclerose sistêmica. Este fenômeno geralmente aparece nas mãos, orelhas, pés e ponta do nariz.
A causa da esclerodermia, tanto na forma localizada quanto na esclerose sistêmica ainda é desconhecida. Contudo, atualmente se conhece bastante sobre os processos biológicos envolvidos nestas doenças. Diversas características clínicas e laboratoriais nos fornecem importantes pistas. Estas pistas podem ser entendidas como peças de um quebra-cabeça que finalmente ao serem juntadas poderão revelar a verdadeira causa da doença.
Entre as várias hipóteses temos: doença vascular, reação autoimune, reação fibrótica e características próprias do hospedeiro suscetível à esclerodermia (por exemplo, genética, raça, sexo e exposição a alguns agentes ambientais, como a sílica).
Entretanto, evidências sugerem que os indivíduos suscetíveis são pessoas predispostas geneticamente a desenvolver danos específicos a insultos ambientais específicos. Estes insultos ou causam danos diretos aos vasos sanguíneos ou perturbam indiretamente os vasos sanguíneos através da ativação do sistema imune.
A esclerodermia localizada é mais comum nas crianças, enquanto que a esclerose sistêmica é mais comum nos adultos. No geral, é mais frequente no sexo feminino que no sexo masculino (geralmente quatro mulheres para cada homem acometido), e a média de idade de início ocorre por volta dos quarenta anos.
Contudo, pode ocorrer em qualquer idade. Quando os médicos utilizam os termos "geralmente" ou "na maioria das vezes", o leitor deve compreender as variações que podem ocorrer. Muitos pacientes se assustam quando leem informação médica que parece contradizer suas próprias experiências, e concluem que aquilo que aconteceu com eles não deveria ter acontecido. Na verdade, existem muitas exceções à regra na esclerodermia, talvez mais nas outras doenças.
Esclerose Sistêmica
Existem dois tipos de esclerose sistêmica (ES): ES cutânea limitada geralmente chamada de Crest; este acrônimo significa:
C- Calcinose – são depósitos de cálcio embaixo da pele
R – Raynand
E – esôfago
S – Sclerodoctilia (afilamento dos dedos)
T – Telangectasias
e ES cutânea difusa. A diferença entre a ES limitada e a ES difusa é a extensão do acometimento da pele. Na ES limitada, o espessamento da pele envolve somente mãos e antebraços, pernas e pés. Na ES difusa, as mãos, antebraços, braços, pés, pernas, coxas e tronco estão acometidos. A face está acometida nas duas formas clínicas da ES. A importância em se fazer a distinção entre a ES difusa e limitada é que a extensão do acometimento da pele pode refletir o grau de acometimento de órgãos internos.
A esclerose sistêmica sine scleroderma é uma situação pouco freqüente (menos de 5% dos casos) na qual existem evidências de acometimento “esclerodérmico” de um órgão interno antes do aparecimento do espessamento da pele.
Diversas características clínicas podem ocorrer tanto na ES difusa quanto na ES limitada. O fenômeno de Raynaud, por exemplo, ocorre em ambas. O fenômeno de Raynaud é uma situação clínica onde os dedos se tornam pálidos ou azulados quando expostos ao frio, e voltam a se tornar corados após o aquecimento. Estes episódios são causados por um vasoespamo dos pequenos vasos sanguíneos dos dedos. À medida que o tempo passa, estes pequenos vasos sanguíneos podem ficar danificados, de maneira que a circulação pode ficar totalmente comprometida nesta área. Este processo pode levar ao aparecimento de microulcerações de polpas digitais. O fenômeno de Raynaud acomete mais de 95% dos pacientes, nas formas clínicas difusa e limitada, podendo causar úlceras digitais dolorosas.
O esôfago também costuma estar afetado em quase todos os pacientes esclerodérmicos. A perda de sua motilidade pode acarretar engasgos freqüentes às refeições, e o refluxo do ácido gástrico para o esôfago pode causar queimação na “boca do estômago”.
Telangiectasias são pequenas manchas vermelhas que aparecem nas mãos, braços, face e tronco. Representam diminutos vasos sanguíneos da pele que se dilataram. As talangiectasias não trazem nenhum perigo, mas são desagradáveis do ponto de vista cosmético, especialmente quando ocorrem na face. A presença de telangiectasias em esôfago, estômago e intestinos pode ocorrer em alguns pacientes, e causar sangramentos.
Pessoas com a forma difusa da ES também podem desenvolver fibrose pulmonar (causando espessamento dos pulmões e interferindo com a respiração, também sendo conhecida como doença intersticial pulmonar) e acometimento renal e intestinal.
Sintomas de doença pulmonar incluem tosse seca persistente e falta de ar. Contudo, nos estágios iniciais da doença, o paciente pode não manifestar sintomas, daí a importância da prevenção.
O acometimento renal ocorre mais frequentemente na ES difusa, especialmente nos primeiros cinco anos após o diagnóstico e geralmente se iniciam com um súbito aumento da pressão arterial. Este aumento da pressão arterial pode não ter sintomas no início. Contudo, se não detectado e não tratado, este aumento da pressão arterial pode danificar os rins em questão de semanas, o que é conhecido como crise renal esclerodérmica. A chave para a prevenção de um dano renal permanente é a detecção e tratamento precoce.
O risco de extenso acometimento do tubo digestivo, com lentificação da motilidade de esôfago, estômago e intestinos, é maior nos pacientes com ES difusa. Estes sintomas incluem o empachamento pós-prandial (sensação de ficar “estufado” por tempo prolongado após as refeições), diarréia, e alternância de diarréia e constipação intestinal.
Calcinose se refere à presença de depósitos de cálcio nas estruturas da pele. Pode tomar a forma de nódulos firmes ou áreas como se fossem contusões que costumam ocorrer em dedos das mãos e cotovelos, mas podem acometer várias outras áreas do organismo. Por vezes, estes depósitos de cálcio podem drenar, formando uma fístula, que estravasa material esbranquiçado, com a consistência de pasta de dente.
Hipertensão pulmonar (HP) representa um aumento da pressão nos vasos sanguíneos dos pulmões. Este aumento de pressão é totalmente independente da pressão arterial, comumente verificada nos braços. Tende a correr nos pacientes com ES limitada com doença prolongada. O sintoma mais comum é a falta de ar aos esforços. Contudo, quando o paciente refere falta de ar, vários testes necessitam ser realizados para avaliar se a HP é a real culpada. Em virtude de que atualmente existem várias medicações para tratar a HP, quanto mais precoce for o diagnóstico e tratamento, melhor tende a ser o prognóstico.
Esclerodermia Localizada
A esclerodermia localizada é caracterizada pelo espessamento da pele devido à excessiva deposição de fibras colágenas. O colágeno é uma proteína presente na pele normal, com função de sustentação. Contudo, quando uma quantidade anormalmente grande de colágeno é produzida, a pele vai se tornar rígida e dura.
A causa ainda é desconhecida. Ela não é infecciosa, não podendo ser transmitida para outra pessoa. Não é hereditária, e muito raramente ocorre em membros de uma mesma família. Alguns a consideram uma “doença autoimune”, mas os pacientes não apresentam outros defeitos conhecidos do sistema imunológico.
Os diferentes nomes causam muita confusão na esclerodermia localizada. Os pacientes que recebem o diagnóstico de “esclerodermia” podem ficar muito assustados pensando que têm esclerose sistêmica, a forma da esclerodermia que acomete os órgãos internos.
Dependendo da forma e da extensão da pele afetada, os tipos principais de esclerodermia localizada: morféia, , esclerodermia linear e “golpe de sabre”.
Morféia
Consiste em placas de pele espessada que podem variar de 1 a 5 cm de diâmetro. Algumas pessoas apresentam somente uma ou algumas poucas placas, enquanto outras pessoas têm múltiplas placas por todo o corpo. Estas placas tendem a ser mais claras ou mais escuras que a pele sobrejacente. Também é comum ocorrer uma perda da camada gordurosa sob as placas de morféia. A morféia não costuma afetar órgãos internos, assim como outras formas de esclerose sistêmica.
Esclerodermia linear
Consiste numa faixa de pele espessada ao longo de um braço ou de uma perna. A camada gordurosa sob a pele também costuma desaparecer, de maneira que o membro afetado se torna mais fino que o membro contra-lateral. Em crianças na fase de crescimento, o membro afetado pode se tornar mais curto que o contra-lateral.
Esclerodermia “em golpe de sabre”
É uma forma de esclerodermia linear onde ocorre uma faixa de pele espessada na testa ou em outro local na face. Em crianças na fase de crescimento, tanto a esclerodermia linear quanto a esclerodermia “em golpe de sabre” podem causar distorções no crescimento do membro afetado ou ausência de simetria na face.
Síndrome Crest
A Síndrome CREST, também conhecida como Esclerodermia Limitada, é uma doença generalizada e rara do tecido conjuntivo, caracterizada por alterações na pele, vasos sanguíneos, músculos esqueléticos e órgãos internos. CREST é um acrónimo para as características clínicas observadas nesta patologia. Estima-se que a sua prevalência seja de 1 a 9/100.000 nascimentos. Tem um surgimento esporádico. A idade de início é a adulta.
Em indivíduos com esta síndrome, o sistema imunológico parece estimular células, chamadas fibroblastos, a produzir quantidades excessivas de colagénio. Normalmente, os fibroblastos sintetizam colagénio para ajudar a curar feridas, mas, neste caso, a proteína é produzida, mesmo quando não é necessário, formando bandas espessas de tecido conjuntivo em torno das células da pele, vasos sangue e órgãos internos.
Apesar de haver uma resposta anormal do sistema imunológico e da produção de colagénio, os investigadores suspeitam que outros fatores possam desempenhar um papel importante, e eles incluem fatores genéticos, gravidez, hormônios e fatores ambientais.
O Fenómeno de Raynaud é uma condição na qual os pequenos vasos sanguíneos das mãos ou pés reagem em resposta ao frio ou à ansiedade. Inicialmente ficam de cor branca e frios, depois tornam-se azulados. Com o retorno do fluxo de sangue voltam à sua cor normal, ficam avermelhados. Nos casos mais graves os tecidos dos dedos podem sofrer danos, levando a úlceras, cicatrizes ou gangrena.
A Disfunção do Esófago ocorre quando a musculatura lisa do esófago perde o movimento normal. Na parte superior do mesmo o resultado pode levar a dificuldades de deglutição, já na parte inferior, o problema pode causar azia crónica ou inflamação.
A Esclerodactilia resulta de depósitos de colagénio em excesso dentro de camadas da pele tornando-a grossa e apertada nos dedos. Este problema faz com que seja mais difícil dobrar ou endireitar os dedos. A pele pode também aparecer brilhante e escura, com a perda de cabelo.
Telangiectasia são pequenas manchas vermelhas nas mãos e no rosto, causadas pelo inchaço dos vasos pequenos vasos sanguíneos. Embora não seja doloroso, as manchas podem criar problemas estéticos.
Até o presente momento, não há cura para a esclerodermia, mas existem muitos tratamentos disponíveis. Cada caso é diferente e as informações devem ser discutidas diretamente com os médicos que podem melhorar em muito a qualidade de vida dos pacientes.